Polo Cultural → Carta de Ourinhos


Exmo. Sr.
Prof. Dr. Fernando Haddad
DD. Ministro da Educação

Prezado Ministro,
Carta de Ourinhos




No dia 24 de julho de 2009, no IX Festival de Música de Ourinhos, no Estado de São Paulo, realizou-se o Seminário “Ensino de Música nas Escolas”, com a presença de representantes das entidades da área musical e educacional, signatárias desta Carta. Neste documento, estão sintetizadas as principais discussões e posições adotadas pelos participantes durante o evento, que reafirmaram seu compromisso de submetê-las a todas as instâncias de suas Instituições, bem como convocar as que não puderam comparecer a aderirem à Carta de Ourinhos. Parte das proposições que ali puderam ser apresentadas recupera preocupações centrais expostas em outras oportunidades, no tocante à implementação da Lei 11.769/08, de 18/08/08, que trata da introdução do ensino de Música na educação básica . Queremos destacar, em particular, que foram expressas decisões assumidas pelos diferentes representantes que, se adequadamente tratadas, podem vir a contribuir para construir, coletiva e conjuntamente com as entidades da área de educação e de música, uma política de formação para nossos alunos e professores. Política esta que ressignifique e reconheça o ensino de Música como de fundamental importância para a educação brasileira.

Em relação aos encaminhamentos da implementação de um ensino de Música de qualidade, os representantes adotaram as posições que se seguem:

  • Trazer para a reflexão, em especial, no espaço escolar, o papel da música que é o de favorecer a expressão e a comunicação humanas. Neste sentido, é preciso: desenvolver o universo cultural de alunos, professores e de todos os segmentos que atuam na escola e em seu entorno; propiciar vivências musicais variadas, que façam pontes entre as experiências cotidianas da escuta e outras produções musicais, internas e externas, próprias da cultura local, ou vindas de outras comunidades; abrir espaço ao fazer musical e mostrar que, por meio do uso do corpo, da voz e da exploração do espaço, pode-se chegar à prática musical;

  • Compreender a música como linguagem e conhecimento, mas que a ênfase seja posta na vivência dos alunos e professores. Diante disso, que o currículo seja “compacto”, apresentando repertórios de “músicas inteligentes”, que façam sentido para alunos e professores, privilegiando, assim, o fazer musical e a criação; pois todo indivíduo, potencialmente, é capaz de atuar musicalmente, se tiver condições e ambientes favoráveis para isso;

  • Reconhecer e respeitar as especificidades dos projetos pedagógicos das escolas, tendo em vista a diversidade do país, evitando-se, assim, propostas de trabalho únicas para implementação de um ensino de música que se pretende de qualidade social. Mas que haja orientações curriculares dos diferentes sistemas públicos de ensino para que se tenha, por outro lado, uma certa coesão curricular, dando sustentação à respectiva aprendizagem.

Quanto aos posicionamentos sobre a política de formação de professores para que se efetive uma educação musical de qualidade, espera-se que:

  • O Ministério da Educação/MEC possa financiar programas de formação de professores específicos, com o objetivo de lançar diretrizes para o ensino de Música nas escolas. Nesta perspectiva, que também possa fomentar, para este processo de implementação e, em parceria com o Ministério da Cultura/MINC, fóruns de discussão sobre o Ensino de Música no país, a ser realizado por toda sociedade organizada, e, em especial, pelos gestores, professores, educadores musicais, pais e alunos;

  • As Instituições Públicas de Educação de Educação Superior, que tenham cursos de Licenciatura em Música (ou com habilitação em Música) possam, em regime de colaboração com os sistemas públicos estaduais e municipais de ensino, oferecer uma formação pedagógica musical adequada, não só aos bacharéis, por elas formados, mas aos professores pedagogos, que ministram aulas na educação infantil e ensino fundamental, e, em caráter emergente, aos demais professores do ensino fundamental e médio (conforme Res. 1, de 11 de fevereiro de 2009 );

  • Os sistemas públicos, estaduais e municipais, possam, também, em regime de colaboração, oferecer espaços e condições necessários para que seja realizada a formação continuada dos professores e educadores musicais, envolvidos com o ensino de Música e sua implementação;

  • As Escolas – gestores, professores, alunos e pais – possam discutir a política curricular e de formação de seus professores e alunos, preconizando a necessidade de que eles participem deste debate, no sentido de reconhecer a importância do ensino da Música no espaço escolar. Nesta direção, os sujeitos/atores envolvidos, ao apontarem os limites e as possibilidades para este processo de implementação, estarão dando, de alguma forma, concretude a este ensino, ao Projeto Político-Pedagógico da Escola como um todo e, em especial, ao trabalho coletivo a ser desempenhado;

  • O Projeto de Formação de Professores (seja inicial e/ou continuada) necessário para a Educação Musical, que desejamos, passa, em especial, pelo currículo da Instituição formadora (Licenciatura em Música e/ou em Pedagogia), que atenda às exigências legais e à demanda por profissionais que sejam competentes e compromissados. Que este currículo possibilite formas de seleção, organização e transformação da Música como conhecimento (objetivos, conteúdos, métodos, avaliação e práticas); e que esta formação privilegie concepções que provoquem a conscientização do professor (e/ou futuro professor) quanto à necessidade de que se renovem, continuamente, as práticas pedagógicas nos espaços escolares e não escolares. Formação inicial e/ou continuada que possibilite a autonomia real ao aluno/professor, para que tenha consciência de sua tarefa no cotidiano escolar: selecionar conteúdos curriculares; organizá-los para atender às necessidades dos alunos e do mundo em contínua transformação; e tomar decisões teórico-metodológicas no enfrentamento dos desafios a serem superados. Pensar, também, nos modos de formação e desenvolvimento profissional destes professores/educadores musicais na perspectiva de que possam socializar os diferentes saberes apreendidos e que sejam capazes de produzir saberes novos, ressignificando a música na vida escolar, e contribuindo, assim, para a sua valoração na cultura geral.

Esperamos, sobretudo, que diante do processo de implementação do Ensino de Música nas Escolas, em vários estados brasileiros, as autoridades responsáveis - MEC, Secretarias Estaduais e Municipais de Educação e seus respectivos Conselhos – possam:

  • definir uma política de formação de professores/educadores musicais, no âmbito das Instituições de Ensino Superior, em especial, nos Cursos de Licenciatura de Música e Pedagogia; assim como em cursos de formação continuada e/ou em serviço;

  • assumir o compromisso de que todos os esforços serão empreendidos para enfrentar os problemas emergenciais e estruturais da formação de professores e educadores musicais no país;

  • colaborar nesse processo por considerá-lo um importante espaço de intervenção na formulação das políticas públicas estaduais e municipais de educação, bem como de divulgação e discussão das posições que temos defendido até o momento na luta por uma formação musical de sentido/significado para professores e alunos, em especial.

Além disso, com a aprovação da Lei, e tendo em vista que a implementação do ensino de Música nas Escolas deverá ocorrer até 2011 e que os profissionais de educação e a classe musical ainda se encontram despreparados para fazer cumprir a Lei, devido a divergências de toda natureza, e, em especial, pela falta de professores de Música, consideramos indispensável que sejam promovidos, em caráter de emergência, Fóruns de Discussão, organizados pelo MEC, em regime de colaboração com outros órgãos responsáveis, para que se abra um amplo debate nacional e que sejam delineadas, como medidas imediatas, diretrizes e ações políticas que contribuam para a efetiva implementação do ensino de Música em nossas instituições educacionais.

Esperando que as solicitações possam ser analisadas e contempladas, enviamos a V. Excia. nossos protestos de elevada estima e consideração.

Atenciosamente
Ourinhos - SP, 24 de julho de 2009


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